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O Pleno do Tribunal de Justiça do RN negou provimento a dois Agravos Regimentais interpostos pelo prefeito do Município de Porto do Mangue, Hipoliton Sael Holanda Melo, e manteve as medidas cautelares estabelecidas contra o gestor, deferindo o pleito do Ministério Público para a prorrogação dessas medidas por mais 90 dias, a partir da publicação da decisão.

Com isso, o prefeito segue afastado do cargo, assim como o gerente contábil do Município, Elizeu Dantas de Melo Neto. Eles estão proibidos de entrar ou permanecer, ainda que para visitação, nas dependências da sede do Poder Executivo Municipal de Porto do Mangue, bem como quaisquer órgãos ou secretarias municipais situadas em prédios diversos.

Hipoliton Sael Holanda Melo foi afastado do cargo em 18 de junho de 2021, após o Ministério Público Estadual deflagrar a operação “Terceiro Mandamento” que apura fraudes em contratos da Prefeitura. Segundo o MP, uma empresa do ramo de comércio de materiais de construção estaria sendo utilizada pelo prefeito, pelo gerente contábil e por outras pessoas para o cometimento de fraudes. Desde 2018, tal empresa foi contratada ao menos oito vezes pela Prefeitura, recebendo a quantia de R$ 2.342.005,67 a título de remuneração decorrente dos contratos públicos firmados.

Os Agravos apresentados pelo gestor são contra decisão proferida pelo desembargador Cornélio Alves, em 18 de outubro de 2021, nos autos da Cautelar Inominada Criminal nº 0806662-80.2021.8.20.0000, que manteve as medidas cautelares; e contra decisão proferida pelo desembargador Saraiva Sobrinho, nos autos da Ação Penal nº 0811863-53.2021.8.20.0000, no dia 28 de outubro de 2021, que decretou novo afastamento pelo prazo de 120 dias.

O Tribunal também negou o pedido de habilitação feito pelo vice-prefeito Francisco Antônio Faustino, que assumiu interinamente o cargo, para acesso aos autos da investigação, bem como de todos os anexos e incidentes apensos relacionados.

Suposto esquema

Na decisão do dia 18 de outubro, o desembargador Cornélio Alves relata que “há elementos indiciários os quais apontam que não só a empresa DEUS É AMOR vinha sendo utilizada para desviar recursos públicos do Município de Porto do Mangue/RN, enriquecendo ilicitamente os supostos participantes do esquema criminoso, mas também outras pessoas jurídicas, titularizadas por laranjas ou ‘testas-de-ferro’, ou, ainda, empresas reais – como fornecedoras, locadoras de veículos –, as quais eram aparentemente contratadas pela DEUS É AMOR para execução de serviços particulares dos investigados e outros possíveis integrantes da organização”.

A decisão também cita indícios de fraudes nas emissões de notas fiscais, pela empresa DEUS É AMOR. “Não há notas fiscais de entrada das mercadorias supostamente vendidas pela empresa ao Município de Porto do Mangue, tampouco foi encontrada a maioria dos procedimentos de contratação da citada empresa. Mais ainda, há aparente reprodução da mesma venda em notas fiscais diferentes, tendo inclusive a empresa emitido três notas fiscais com valores idênticos e com a mesma relação de produtos. Não obstante algumas dessas circunstâncias reveladas digam igualmente respeito aos próprios fatos investigados, há, como dito, veementes indícios de um engenhoso esquema supostamente operado pelos investigados, no seio da Administração do Município de Porto do Mangue, que vai além da empresa DEUS É AMOR e que, potencialmente, continuou mesmo após o encerramento ‘virtual’ das operações desta empresa, revelando, pelo menos por ora, circunstâncias contemporâneas que encerram risco à ordem pública e ao erário daquela municipalidade”.

Agravos

Ao analisar os Agravos Regimentais, o relator, desembargador Cornélio Alves, refutou as alegações do gestor afastado de “ausência de imputação objetiva ao réu” e de “ausência de contemporaneidade dos fatos narrados”.

O magistrado destaca que a leitura dos documentos e depoimentos que instruem o pedido do MP revelam que empresas utilizadas pelo gerente contábil do Município, Elizeu Melo Neto, ou por “laranjas”, bem como outras empresas, foram aparentemente utilizadas para desvio de verbas públicas do Município de Porto do Mangue. Também há documentos indicando que mesmo após o assassinato de um dos supostos “laranjas”, foram emitidas pela empresa DEUS É AMOR notas fiscais aparentemente fictícias, correspondentes a vendas de produtos para os quais, até o momento, não há qualquer comprovação de entrega ao Município.

“Os fatos, como dito na decisão, ultrapassam o lapso temporal dos contratos ‘formalmente firmados’ com a empresa DEUS É AMOR, passando aparentemente a envolver também outras empresas, com incremento modus operandi, além da troca dos ‘laranjas’”, destaca o voto.

Cornélio Alves também faz referência ao depoimento extrajudicial do ex-secretário municipal de Administração, colhido em 14 de setembro de 2021, no qual este afirma peremptoriamente que o prefeito autorizava a efetivação de pagamentos à empresa DEUS É AMOR, mesmos em processos incompletos, sem medições, notas de recebimento ou mesmo assinaturas.

Há ainda a apresentação de indícios pelo MPRN de que, durante o breve período de retorno de Hipoliton ao cargo de Prefeito, este teria concorrido para a falsificação de documentos públicos e utilização desses documentos, com a finalidade de atrapalhar as investigações e encobrir os delitos averiguados no PIC n.º 0808157-96.2020.8.20.0000.

“A arguição de que, por ter enviado diversos documentos sem assinatura, não poderia ter participado das possíveis falsificações, tampouco agido com dolo na utilização desses documentos, resta enfraquecida diante do fato de que a totalidade desses documentos (sem sua assinatura), já havia sido enviada ao Parquet. Os documentos a que se refere a nova denúncia dizem respeito justamente às peças que supostamente instruíram os procedimentos licitatórios ou de dispensa/inexigibilidade de licitação objeto da primitiva investigação, por muito tempo sonegados aos órgãos de controle, os quais não haviam sido encontrados nem pela gestão interina, durante o primeiro afastamento do Prefeito, tampouco nas diligências de busca e apreensão realizadas nas repartições municipais, autorizadas pela justiça em procedimento conexo aos presentes autos”.

Assim, decidiu o relator que além da materialidade e fartos indícios da autoria delitiva atribuída ao acusado, os fatos contemporâneos referenciados indicam que sua permanência na gestão do Município de Porto do Mangue, bem como seu acesso às repartições públicas municipais e seu contato com as testemunhas, declarantes e demais investigados, encerra o risco de utilização da máquina administrativa para cometimento de novas infrações penais e mácula à instrução processual.

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