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Promotor Vicente Elísio de Oliveira Neto, concluiu o dour

A manchete e o texto foram divulgados pela assessoria de comunicação da Universidade Federal da Paraíba. Eles noticiam sobre o Promotor de Justiça, caicoense, Vicente Elísio de Oliveira Neto, que terminou o doutorado em ciências jurídicas, com o trabalho voltado para a inclusão social das pessoas com deficiência, por intermédio da efetivação dos seus direitos no contexto nacional.

*Leia a notícia:

O pesquisador Vicente Oliveira tornou-se a primeira pessoa com deficiência visual a defender uma tese no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Ciências Jurídicas da Universidade Federal da Paraíba (UFPB). O trabalho é voltado para a inclusão social das pessoas com deficiência, por intermédio da efetivação dos seus direitos no contexto nacional.

A tese, intitulada “Deficiência, direitos das pessoas com deficiência e tópica jurídica: o convívio antinômico entre os pontos de vista biomédico e biopsicossocial no Direito brasileiro“, orientada pelo professor Enoque Sobreira, foi defendida e aprovada em 21 de agosto, por meio de banca virtual.

Antes de garantir o título de doutor, Vicente Oliveira atuou como professor da rede municipal de ensino, cursou a graduação em Direito, concluiu o mestrado, foi servidor da Justiça Federal e passou em concurso para promotor de justiça, cargo que ocupa atualmente. Na seleção para doutorado, passou em primeiro lugar, na linha de pesquisa para a qual concorreu.

Vicente Oliveira não considera que tenha uma história de superação e costuma dizer que, talvez, tenha uma história diferente da  maioria das pessoas com deficiência; uma história de oportunidades.

Primeiro, fui criado no seio de uma família que me incluiu e aqui registro o protagonismo de minha mãe, pois perdi meu pai na infância. Entendo que esse foi o alicerce para o resto da construção de toda uma vida. Sempre fui estimulado a buscar o conhecimento independente do meu impedimento visual”, avalia.

Ele destaca que, em todas as instituições por onde passou, sempre contou com a colaboração das pessoas e, em sua grande maioria, não por imposição legal, mas por ato de disposição voluntária. Como, por exemplo, uma colega de sala que fazia a leitura, escrevia ou digitava um trabalho. Um professor ou chefe mais atencioso que não via a deficiência como incapacidade ou doença. E em casa, com o apoio incondicional da família e de muitos amigos.

Entendo que a pessoa com deficiência, assim como todo e qualquer ser humano, apesar de sua autonomia em diversos momentos ao longo da vida, necessita do apoio de terceiros. Não há incompatibilidade entre autonomia e apoio, conforme defende aqueles que se referem ao paradigma da interdependência humana”, enfatiza o pesquisador.

Além de vivenciar a experiência da deficiência, Vicente afirma que vem se dedicando – por disposição pessoal, dever institucional e compromisso acadêmico – ao estudo do fenômeno da deficiência e à defesa da inclusão social, política, econômica e cultural do segmento social com deficiência, por meio da efetivação dos seus direitos humanos-fundamentais.

No mestrado, Vicente Oliveira já trabalhava com temática relacionada às pessoas com deficiência e seus direitos, sendo que, naquela ocasião, pesquisava especialmente o direito à inclusão educacional das pessoas com deficiência a partir das decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) sobre esse tema.

Percebi que a deficiência era tratada, na maioria das vezes, como uma doença, um estado patológico, tanto na área do Direito quanto no meio social em geral. Essa compreensão da deficiência, denominada biomédica, explica a deficiência como um problema que afeta o corpo e/ou a mente da pessoa, como um problema do indivíduo divorciado do meio social”.

Vicente Oliveira ainda ressalta que, em consequência, as pessoas com deficiência eram excluídas do meio social em razão da sua doença e não das barreiras que enfrentam no convívio social. Desde os anos 2008 e 2009, a constituição brasileira passou a adotar uma compreensão biopsicossocial da deficiência, de modo que as pessoas com deficiência não podem mais ser equiparadas às pessoas doentes.

De acordo com o texto constitucional, “pessoas com deficiência são aquelas que têm impedimentos de longo prazo de natureza física, mental, intelectual ou sensorial, os quais, em interação com diversas barreiras, podem obstruir sua participação plena e efetiva na sociedade em igualdades de condições com as demais pessoas“.

O pesquisador analisa que, com esse novo conceito, a inclusão social das pessoas com deficiência depende da eliminação de barreiras materiais e culturais que impedem sua participação em todos os espaços do convívio social.

 Apesar disso, parte da legislação, das políticas públicas e das decisões judiciais continuam tratando as pessoas com deficiência como doentes, incapazes ou inválidas e, em razão disso, perpetuam a exclusão. “Tal tratamento preconceituoso e discriminatório vem sendo contemporaneamente identificado por meio do termo “capacitismo”.

Concepção biopsicossocial da deficiência

Em sua tese de doutorado, Vicente Oliveira buscou verificar, particularmente, se a definição biopsicossocial da deficiência estaria sendo observada nas atividades estatais de criação e aplicação do Direito no Brasil.

Demonstrei e tive aprovada a tese, segundo a qual o convívio antinômico entre as definições biomédica e biopsicossocial da deficiência na conformação de políticas públicas, provimentos jurisdicionais e diplomas normativos constitui-se em obstáculo à implementação do programa de proteção especial das pessoas com deficiência”.

Vicente Oliveira trabalhou com a dialética, nos termos e limites estabelecidos pelo filósofo Aristóteles. É sob tais marcos que se encontra a referência que guiou o desenvolvimento da tese, a tópica jurídica de Theodor Viehweg (jusfilósofo alemão).

A abordagem dialética aristotélica apresentou-se como a mais adequada para a consideração dos distintos e conflituosos pontos de vista relativos à deficiência (biomédico, social e biopsicossocial).

Para tanto, me utilizei de pesquisas em referências teóricas, decisões judiciais, atos administrativos e legislativos, documentos e tratados internacionais relacionados ao objeto da tese. Examinei e confrontei as fontes levantadas visando à assimilação, crítica, seleção e catalogação de argumentos e fundamentos necessários e suficientes à explicação e equacionamento do problema que impulsionava minha pesquisa, bem como da verificação da hipótese que levantei”.

Diante da abordagem interdisciplinar desenvolvida na pesquisa, o estudo pretende repercutir e influenciar nas áreas da teoria e da aplicação do Direito, da Educação, da Sociologia, da Psicologia Social, das ciências da saúde em geral e das políticas públicas relativas à inclusão das pessoas com deficiência.

Os casos investigados na tese demonstraram que parte das decisões judiciais, políticas públicas e projetos de lei atualmente em tramitação no Congresso Nacional relativos aos direitos das pessoas com deficiência permanecem empregando a concepção biomédica da deficiência.

A definição normativa da categoria “pessoas com deficiência” constitui-se no ponto de partida estruturante de todo o programa jurídico especial titularizado pelo contingente social com deficiência. Sua desconsideração, rejeição ou substituição por um conceito baseado em critérios estritamente biomédicos implica na desconstrução do programa a partir dele edificado e sustentado”.

A tese poderá servir de norte para ampliar conceitos e práticas pedagógicas, desde a elaboração de uma lei, passando pela aplicação de uma política ou programa includente e culminando com a busca pela efetivação do Direito à inclusão em caso de necessária análise pelo judiciário brasileiro.

O trabalho científico também insere a temática da inclusão social das pessoas com deficiência por meio da efetivação dos seus direitos dentre os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) previstos na Agenda 2030 da Organização das Nações Unidas (ONU).

No contexto dos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável, constata-se que ao menos dez deles estão intimamente comprometidos com a efetivação do catálogo dos direitos da parcela humana com deficiência, instituído pela Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência e incorporados ao Direito brasileiro como status de normas constitucionais. 

As temáticas da deficiência e das pessoas com deficiência vêm ganhando espaços no cenário internacional e na realidade brasileira. No âmbito local, os temas ingressam na pauta dos meios de comunicação tradicionais e no mundo virtual.

Inúmeras são as iniciativas promovidas pela sociedade civil, com ou sem apoio material e/ou financeiro público. No setor público, o clima é o mesmo. No meio parlamentar, verifica-se o incremento da produção legislativa, seguido sempre de novas proposições, embriões viáveis ou não de futuras leis. Na esfera acadêmica, o ensino, a pesquisa e a extensão cada vez mais atentam para as questões que dizem respeito às pessoas com deficiência”.

Apesar de toda essa visibilidade e atenção, Vicente lembra que uma parcela das mencionadas iniciativas, programas, projetos e leis encontra-se em desconformidade com o programa jurídico includente das pessoas com deficiência que, no caso brasileiro, foi instituído por meio de normas de status constitucional.

É buscando equacionar tal problema jurídico de imensa repercussão política, econômica, social e cultural que tenho procurado articular vivência pessoal, dever institucional e compromisso científico”.

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