Descontado os dois anos da pandemia de covid-19, o primeiro semestre de 2023 teve o menor número de greves desde 2014, segundo o levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). Foram feitas, segundo a pesquisa, 558 paralisações de trabalhadores de janeiro a junho. Em 2022, no mesmo período, foram 679. Em 2014, foram 1.233 mobilizações nos primeiros seis meses do ano.
A maioria dos movimentos realizados neste ano partiu de funcionários do setor público (60,8%). Em 37,5% as greves foram feitas por funcionários de empresa privadas, enquanto 1,8% das paralisações envolveu as duas categorias de trabalhadores.
O reajuste salarial é a reivindicação que mais aparece como motivação das greves (41,6%), seguida por pagamento do piso salarial para as categorias (32,8%). No entanto, também são significativos os movimentos que têm na pauta a melhoria das condições de trabalho (21,5%) e o pagamento de salários em atraso (20,1%). Em 65% dos conflitos, houve atendimento ao menos parcial das demandas.
Nas greves do serviço público, a maior parte partiu de trabalhadores municipais (74%), enquanto servidores estaduais protagonizaram 20,7% dos movimentos e federais 4,3%. Nesses movimentos, o reajuste salarial e pagamento dos pisos de categoria continuam a ser as reivindicações mais importantes, presentes em 54,5% e 52,3% das mobilizações, respectivamente. Porém, a melhoria das condições de trabalho tem maior importância na pauta dessas paralisações, presente em 30% das pautas, e a melhoria dos serviços públicos também foi reivindicada em 27,9% dessas greves.
Nas greves do setor privado, 49,3% das mobilizações pediam pagamento de salários em atraso. As reivindicações sobre alimentação, como pagamento de vales e auxílios, vêm em segundo lugar de importância, presentes em 36,4% dos movimentos enquanto os pedidos de reajuste salarial aparecem em terceiro lugar, em 23,4% das greves.
Incertezas
Para o sociólogo do Dieese, Rodrigo Linhares, a redução do número de greves se deve, em parte, a uma menor sensação de segurança dos trabalhadores devido às sucessivas crises nos últimos anos. “Os movimentos de greves são sempre deflagrados tendo em conta uma expectativa plausível de ganho”, enfatiza. “Quando existe insegurança no ar, isso já é um motivo para que nas assembleias trabalhadores de empresas privadas ou do Estado fiquem mais reticentes na hora de votar a deflagração de uma greve”, acrescenta.
Além disso, as reformas trabalhista e sindical impactaram, segundo o especialista, na capacidade dos sindicatos em promover mobilizações e negociações. “Os sindicatos tinham que se virar com um corte grande de recursos, dispensar funcionários, assessores”, diz.
Privatizações
Na avaliação de Linhares, Soma-se a esta situação a crescente privatização dos serviços públicos, através das terceirizações, fortemente presentes em setores como a saúde e a limpeza urbana. “Terceirização no serviço público raramente foge ao esquema que é: depreciação do serviço prestado, descumprimento de leis trabalhistas e más condições de trabalho”, afirma.
Como exemplo, o sociólogo cita as Linhas 8 – Diamante e Linha 9 – Esmeralda do sistema de trens metropolitanos de São Paulo, que desde janeiro de 2022 são administradas pela Via Mobilidade. Em agosto, a empresa assinou um Termo de Ajustamento de Conduta com o Ministério Público de São Paulo que prevê o pagamento de uma indenização por danos materiais e morais coletivos de R$ 150 milhões.
“O metrô de São Paulo, se a gente for comparar os danos a população causados pela paralisação dos metroviários, e comparar com o número quase semanal que ocorrem nas linhas privatizadas de trem, dá para dizer, com certeza, que o passageiro das linhas privatizadas sofre muito mais do que o passageiro do metrô estatal estadual”, destacou o especialista, levando em consideração de que as greves, muitas vezes, são usadas como argumento para realizar as privatizações.
O governo de São Paulo se prepara para fazer novas concessões de linhas de trens e metrô, em 11 leilões até 2026.
Agência Brasil