Relatório publicado nesta quinta-feira 19 por um braço da OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) registrou preocupação com os efeitos da recente decisão do ministro Dias Toffoli, do STF (Supremo Tribunal Federal), que anulou provas do acordo de leniência da empreiteira Odebrecht.
O documento, que tem 117 páginas, é um balanço sobre o cumprimento por parte do Brasil dos pontos estabelecidos na Convenção Antissuborno da OCDE, um fórum político que reúne mais de cem países.
A avaliação foi feita por um grupo de trabalho com representantes dos governos da Colômbia e do Reino Unido, que também são países signatários. Nela, há críticas sobre casos de corrupção transnacional no país que permanecem sem desfecho ou são anulados –nenhum indivíduo chegou a receber condenação definitiva por suborno transnacional no Brasil, destaca o documento.
Ao longo do relatório, os avaliadores mencionam ainda que vão monitorar o impacto da decisão de Toffoli em processos judiciais e questionam a capacidade de investigadores brasileiros seguirem cooperando internacionalmente após o despacho do ministro.
Na decisão de Toffoli, assinada em 6 de setembro, uma suposta informalidade na tramitação de documentos via cooperação internacional é um dos pontos considerados pelo magistrado para declarar imprestáveis as provas obtidas no bojo do acordo de leniência da empreiteira.
O ministro menciona tratativas diretas de procuradores da força-tarefa da Operação Lava Jato com membros do Departamento de Justiça dos Estados Unidos da América e da Procuradoria-Geral da Suíça, por exemplo.
Em seu relatório, o grupo de trabalho da OCDE afirma que autoridades com funções semelhantes nos países estabelecem contatos informais, o que seria “uma boa prática, crucial e internacionalmente aceita”.
Recursos contrários à decisão de Toffoli ainda não foram julgados e o caso deve ser analisado pelos demais ministros do STF, em plenário.
Além disso, o documento da OCDE também aponta preocupação com um possível “efeito inibidor” do trabalho de investigadores a partir de mudanças na Lei de Abuso de Autoridade e na esteira de ações disciplinares, cíveis e criminais movidas contra procuradores.
Por outro lado, o relatório também cita um viés político na atuação de investigadores brasileiros, com “a percepção de politização da Procuradoria-Geral da República e a interferência indevida do ex-presidente [Jair Bolsonaro] na Polícia Federal” e em outras unidades de investigação.
Ainda sobre o viés político de autoridades do sistema judiciário, o relatório menciona o episódio de 2019 que trouxe à tona mensagens privadas trocadas pelo então juiz Sergio Moro e procuradores da República. “A politização e a falta de neutralidade reveladas por essas mensagens também levaram à descontinuação do modelo de forças-tarefa”, diz trecho.
O grupo de trabalho também reconheceu avanços do país no enfrentamento à corrupção transnacional, como os acordos de leniência firmados ao longo dos últimos anos e a atuação preventiva da CGU (Controladoria-Geral da União).
Outros pontos considerados positivos, citados no relatório, são o aumento dos recursos disponíveis para a Polícia Federal investigar crimes de corrupção e o abandono pelo Congresso Nacional da tentativa de interferir politicamente no CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público) com a “PEC da Impunidade”.
AgoraRN