A data 8 de março é lembrada como o Dia Internacional da Mulher. Dia de celebrar ou de alertar para as lutas das mulheres em busca de mais espaço e reconhecimento? Historicamente, as mulheres foram invisibilizadas e impedidas de atuar em áreas majoritariamente masculinas como, por exemplo, nas ciências exatas.
Pensando em promover o acesso de meninas e mulheres em situação de vulnerabilidade, especialmente, aos cursos de química e física, professoras da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (Uern) elaboraram o projeto “Meninas e mulheres potiguares: um caminho para analisar o passado e construir perspectivas de futuro em carreiras de Química e Física”. O intuito é possibilitar o acesso às ciências exatas como parte integrante dos direitos humanos e do direito à cultura científica, com vistas à redução de desigualdades nessas áreas.
“O campo das ciências exatas é um campo ainda considerado masculino, daí a dificuldade do acesso e a permanência das mulheres nessa área. Então, é uma luta nossa para desnaturalizar o campo das ciências exatas como algo supostamente masculino,pois entendemos que nenhuma ciência é masculina”, comentou a professora Mirla Cisne, pesquisadora sobre feminismo e colaboradora do projeto.
Ao longo da história, muitas mulheres se destacaram nas ciências, a exemplo da cientista Marie Curie, primeira mulher a ser laureada com o prêmio Nobel e, até hoje, a única pessoa a recebê-lo em duas áreas distintas: Nobel de Física (1903) e Nobel de Química (1911). Esse é apenas um exemplo do quanto as mulheres são capazes de fazer ciência e de marcar a história. O que tem impedido, então, de vermos mais figuras femininas em destaque, especialmente nas ciências exatas?
Gabriella Santos, professora de química na Uern e uma das coordenadoras do projeto Meninas e Mulheres Potiguares, atribui isso à divisão do trabalho, já que por muito tempo se propagou que as ciências exatas não eram para as mulheres . “Por isso, são necessários incentivos e projetos para ajudar a mudar essa realidade”, disse.

Atualmente, o curso de química da Uern Mossoró tem 85 estudantes matriculados, sendo que aproximadamente 50% deles são mulheres. Já no curso de física, a realidade é mais preocupante. Dos 54 estudantes matriculados no curso, apenas 18 são mulheres. No quadro de professores, a desigualdade também é visível. Em física, há somente duas professoras, em um total de 12 docentes. Em química, são 5 mulheres, de um total de 16 professores. Para Kelânia Mesquita, uma das coordenadoras do projeto, essa “falta de representatividade dificulta a identificação e o desenvolvimento de um senso de pertencimento a esses cursos”, e complementa: “Esperamos que ações concretas como as desenvolvidas nesse projeto nos permita começar o processo de superação dessas dificuldades”.
Nesse sentido, o projeto deve oportunizar que garotas conheçam e se interessem pela ciência, entendendo que elas podem estar em qualquer lugar. Para isso, acontecerá a interação com escolas públicas de Ensino Básico, onde serão realizadas diversas atividades como oficinas, produção de material midiático audiovisual, divulgação científica usando o teatro de temática científica, simpósios e palestras. A execução do projeto será realizada por pesquisadoras das áreas de Química, Física e Serviço Social, de três instituições de ensino superior, públicas: IFRN – Campus Ipanguaçu/RN, UFRN – Campus Natal/RN e a UERN – Campus Mossoró/RN.
“Com o apoio do CNPq, oferecemos 20 bolsas de Iniciação Científica Júnior para essas meninas por 36 meses e, por igual período, para as professoras que as acompanharão nessa jornada nas escolas escolhidas”, informou a professora Kelânia Mesquita.
Desconstruindo estereótipos de gênero: mulheres em todas as áreas de atuação
Durante as rodas de conversa e oficinas, serão tratados temas como as relações de gênero, divisão sexual do trabalho e relações étnico-raciais. A ideia é fazer com que as estudantes entendam como foram construídos os estereótipos que limitam, até hoje, as escolhas e aspirações das meninas e, sobretudo, para conscientizá-las da importância de mudar essa realidade. “Como nossa cultura ainda é muito patriarcal, muitas meninas são induzidas, levadas a compreender que são mais propícias ou que as mulheres são mais naturalmente aptas para ciências humanas, por exemplo. E precisamos desconstruir isso”, comentou a professora Mirla Cisne, colaboradora do projeto.
A promoção da visibilidade e valorização das mulheres na ciência pode ter um impacto significativo na motivação e engajamento das alunas da Educação Básica e da graduação em cursos de Ciências Exatas. Ao destacar e celebrar as realizações das mulheres cientistas, é possível inspirar e encorajar mais meninas e mulheres a seguirem carreiras nessas áreas.
Nesse sentido, o projeto vai contribuir de forma significativa. “A importância do projeto está exatamente em desnaturalizar essa divisão sexual do trabalho, compreender que a divisão sexual do trabalho é uma construção social e, portanto, pode ser desconstruída. Então um dos objetivos do projeto é exatamente estimular as mulheres a perceber que as ciências exatas também é espaço de mulher”, finalizou Mirla Cisne.